Amputação

Amputação é brutal.
Não encontrei alguém que não ficasse abalado ao ouvir dizer "meu pai perdeu a perna direita". Uns choraram um choro solto e doído, outros se encolheram, outros ficaram catatônicos. Amputação é brutal. Mas também pode ser libertadora. Brutalmente libertadora.
Há uma semana vi meu pai na UTI e tive certeza que era a última vez que o via. A infecção estava vencendo. Saí dali de luto, abalada e aos prantos, apenas esperando o telefone tocar, o peso da morte sobre meus ombros e agarrado ao meu coração. Algumas horas depois, tocou mesmo, para me avisar que iam amputar a perna dele.
Foi um misto de choque e alívio, de dor e paz, uma anestesia na minha angústia. Imediatamente eu entendi que era a última chance do meu pai viver. Lembrando da aparência dele naquela tarde, eu orei e pedi ao Senhor que se fosse para passar por mais isso e não sobreviver, que ele não chegasse à cirurgia. Foi uma longa noite, esperando sempre o telefone tocar. Chegou a manhã, e ele ainda estava vivo. Acho que nenhum de nós acreditava que ele sobreviveria à cirurgia. Uma semana antes ele tinha passado por uma anestesia geral, estava com infecção, respirava muito mal. Tem 88 anos.
Mergulhamos na hora mais sombria. Uma hora foi a duração da cirurgia. Médico e anestesista inspirados por Deus. E ele não só sobreviveu mas seu estado geral ao final era melhor do que no início, ficou acordado durante a cirurgia! Quando essas notícias chegaram, o choro de alívio era incontrolável. Agradecemos a Deus, Ele sempre sabe o que é melhor. Minha mãe ficou muito triste e abalada. Era a única coisa que ela pedia a Deus nesse tempo todo: que ele não perdesse a perna. Se não tivesse sido a escolha entre uma chance de vida e uma morte certa, penso que ela nunca se conformaria.
A morte daquela perna de vez em quando me assombra, confesso. Uma perna viva jogada fora! Só que se ela não tivesse ido sozinha, já teria ido com ele. Diante disso, o choque dá lugar à esperança. Meu pai continua lutando, venceu a infecção e foi pego pela pneumonia. Parecia o fim da linha, mas o fato dele ter sobrevivido àquela cirurgia foi um grande recado pra nós. Assim disse o dr. Edgar quando decidiu amputar: "ele nunca desistiu dessa luta, eu não vou desistir dele". E meu pai correspondeu, mais uma vez não desistiu. Agora, enquanto ele está lá deitado, sem poder fazer nada a não ser esperar e não morrer, nós também não desistimos dele. A amputação soprou vida em nós, soprou a esperança e a vontade de trazê-lo de volta para casa. Temos orado incansavelmente, junto com tantas pessoas que nos amam e amam meu pai, com um espírito diferente, cheio de vida, crendo que ele vai voltar. Deus é soberano em todo tempo, e se decidir que ele não vai voltar, assim será. Não me cabe saber o que Deus pensa, só me cabe ler os sinais e caminhar para onde estão apontando.






Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Quais são suas intenções com a minha filha?

Beleza Colateral

O DIA EM QUE EU VIREI GENTE GRANDE